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Ônibus maltratado, maratona ao volante e prosa: como é a 'tarifa zero' na região de Campinas

Tarifa zero em Morungaba: o que diz a população que usa o ônibus de graça Enquanto o governo federal discute a viabilidade da chamada tarifa zero no transpo...

Ônibus maltratado, maratona ao volante e prosa: como é a 'tarifa zero' na região de Campinas
Ônibus maltratado, maratona ao volante e prosa: como é a 'tarifa zero' na região de Campinas (Foto: Reprodução)

Tarifa zero em Morungaba: o que diz a população que usa o ônibus de graça Enquanto o governo federal discute a viabilidade da chamada tarifa zero no transporte público, algumas cidades da região já oferecem a gratuidade à população. São sistemas bem menores que os das grandes cidades como Campinas, que em vez de centenas de veículos e milhares de passageiros, contam com um ou poucos ônibus. Quem usa agradece o fato de não pagar pelo serviço, mas a falta de uma tarifa para avançar a catraca não é garantia de bom atendimento. O g1 pegou carona no transporte público em Artur Nogueira, Morungaba e Holambra, e se deparou com ônibus maltratado, maratona ao volante e também uma boa dose de prosa nas viagens. Ônibus maltratado Tarifa zero em Artur Nogueira: o que diz a população que usa o ônibus de graça Em Artur Nogueira, cidade de 51,4 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o sistema do transporte público dispõe de dois ônibus em circulação - um titular e um reserva -, com linhas que começam a operar às 5h20 e fazem a última viagem por volta de 19h. O g1 embarcou na rodoviária no dia em que o veículo reserva, um antigo ônibus do transporte escolar, estava em circulação. Siga o g1 Campinas no Instagram 📱 Embora tenha sobrado simpatia e atenção ao motorista, o veículo que ele conduzia não demonstrava as melhores condições, em especial dos bancos, muitos deles rasgados e com sinais de desgaste. "Por ser gratuito, a gente não tem muito do que reclamar, mas poderia melhorar. Já aconteceu do ônibus quebrar e eu chegar atrasada. Uma vez tive que pedir Uber pra rodoviária. A Prefeitura tem condições, sim, de oferecer um transporte melhor para a população", destaca Maraisa Rebeca, de 21 anos, que usa o transporte para ir e voltar do trabalho todos os dias. Marinete Leal, de 51 anos, diz esperar por melhorias, incluindo ônibus mais novos e com melhor acessibilidade. "Para subir essa altura [dos degraus], assim nessa idade, para pessoas mais idosas ou crianças, é desconfortável. Agradeço por estar rodando, mas tem coisas que poderiam melhorar", diz. Segundo a usuária, entre os pontos também a serem melhorados estão a inclusão de mais ônibus e a atenção de alguns condutores. "Tem motorista que você tá perto do ponto, pede para parar, eles não param. Tem gente que está indo trabalhar, e não esperam não", afirma. Em Artur Nogueira (SP), transporte público municipal é gratuito, mas veículo exibe desgaste, principalmente nos bancos do antigo ônibus escolar Fernando Evans/g1 A dona Laudelina Aparecida Ferreira, de 60 anos, conta que costuma andar de bicicleta pela cidade, mas por conta da saúde, teve de recorrer ao coletivo. Ela pontua que no geral é tranquilo usar o transporte público em Artur Nogueira, mas que às segundas e sextas, logo pela manhã, a sensação é de virar "sardinha em lata." "Ajuda bastante, para mim mesmo que tenho problema de saúde e não estou conseguindo andar de bike, o circular ajuda bastante. Não é lá aquelas coisas, mas serve a gente. Às vezes quando quebra, e não tem outro pra socorrer, não passa no horário. Na segunda e sexta, vem igual sardinha em lata. É muita gente", conta. Ao lado do filho, Ana Rosa Pereira, de 46 anos, explica que costuma usar o ônibus de vez em quando, apenas quando precisa deixar o bairro e ir ao centro. "É bem acessível para a gente, facilita. Mas se tivesse de pagar, aí era complicado", diz. O que diz a prefeitura? Procurada para comentar os pontos observados pelo g1 e destacados pelos usuários, a prefeitura de Artur Nogueira informou que tem planos de reforma dos veículos e busca parcerias para adquirir novos ônibus para ampliar o modernizar o serviço. Ainda segundo a administração, eventuais atrasos ocorrem em situações específicas, como falhas mecânicas, e que o itinerário é seguido à risca. Confira a nota na íntegra: "Atualmente, o Programa Catraca Livre conta com dois ônibus em circulação, atendendo a população de segunda a domingo, em todas as regiões da cidade. A Secretaria de Obras e Serviços já tem planos de reforma dos veículos existentes e está em busca de parcerias para a aquisição de novos ônibus, ampliando e modernizando o serviço. Eventuais atrasos são pontuais e costumam ocorrer em situações específicas, como falhas mecânicas - quando o veículo é rapidamente substituído, garantindo a continuidade do trajeto - ou durante melhorias no asfalto e na sinalização de trânsito, que podem exigir ajustes temporários no percurso. O itinerário é seguido à risca, e a Administração Municipal reforça o compromisso de manter e aprimorar o transporte Catraca Livre, um serviço que garante acesso gratuito e essencial à mobilidade urbana para toda a população nogueirense." Maratona ao volante O transporte público em Morungaba, cidade de 13,7 mil habitantes, é feito com um veículo, novo e com ar-condicionado. Mas enquanto há um ônibus reserva em caso de quebra ou manutenção, o mesmo não ocorre com quem está atrás do volante. A responsabilidade de conduzir os passageiros por cerca de 230 km diários, é de apenas um motorista. Esse único funcionário é responsável por rodar das 5h às 19h, de segunda a sábado, e até às 13h, aos domingos. A situação é motivo de bronca de um passageiro. Para José Carlos, de 57 anos, o transporte é bom, mas a rotina do servidor atrás do volante é exaustiva. "[O transporte] é bom, só não é bom o horário que o motorista faz. Ele pega às 5h e para 7h da noite. Eu discordo. Deveria ser dois motoristas, para um aliviar o outro", diz. Quem enfrenta essa verdadeira maratona ao volante é Aguinaldo Martins, de 49 anos, 23 deles como motorista da prefeitura, e há seis no transporte público. Simpático e muito receptivo, Aguinaldo fez questão de mostrar o ônibus durante a parada na rodoviária. "Não precisa apresentar nada, é só chegar. Tudo gratuito", avisa. Com tantos anos ao volante, e sendo o responsável pelo serviço todos os dias, não há um passageiro que ele não conheça. "Conheço todos, já tem os pontos certos. Não tem erro", brinca. Procurada, a Prefeitura de Morungaba confirmou que há apenas um motorista para o transporte público da cidade, e que o servidor é que realiza, sem folga, o itinerário de todas as linhas. Sobre a contratação de um novo funcionário para auxiliar na função, a administração destacou que depende da situação financeira, e não deu prazo para isso. Em Morungaba (SP), ônibus que transporte a população de graça é novo e com ar-condicionado, mas apenas um motorista é responsável por conduzir o veículo das 5h às 19h, de segunda a sábado Estevão Mamédio e Fernando Evans/g1 Alívio para o bolso Também motorista, José Carlos reconhece que ter a tarifa zero na cidade é uma facilidade, que traz uma economia representativa para o bolso Quem reforça isso é o mecânico Denis Ricardo, de 47 anos. Ao lado do filho Samuel, de 18 anos, que também trabalha em oficina, o ônibus de graça trouxe um alívio ao bolso. "Como ajuda [ser de graça], caiu do céu. Porque eu tinha que colocar minha condução para trabalhar. Quando anunciaram o transporte público gratuito, ergui as mãos ao céu e agradeci a Deus. Rapaz, nada, nada eu deixei de gastar uns R$ 500 e pouco de combustível", afirma. O mecânico ainda elogia o modelo atual do ônibus, com ar-condicionado. "Agora tá no céu", brinca. Segundo a jovem Gabriela Collazos, de 21 anos, o ônibus é usado geralmente para levar o filho Ravi, de 2 anos, para a creche ou passear na Praça dos Italianos. "Facilita, conheço todo mundo." Verificadora em uma fábrica de lingerie, Alexsandra Oliveira, de 23 anos, lembra que muita gente não teria condição de arcar com os custos de uma tarifa. "Ajuda bastante gente", completa. Bom pra prosear Em Holambra (SP), transporte público é gratuito desde 1994, e serviço é ponto de encontro para boas conversas Fernando Evans/g1 Em Holambra, município de 15 mil habitantes, o transporte circular gratuito existe desde 1994. Segundo a prefeitura, a frota municipal é composta por quatro ônibus e um micro-ônibus, que atendem tanto a zona urbana quanto a zona rural. Em uma volta pelo sistema foi possível testemunhar que a viagem é embalada por conversa boa, brincadeiras e risadas entre usuários e o motorista. Tratado como "uma lenda" e "patrimônio" da cidade, um dos passageiros é José Paulino de Souza, de 82 anos, conhecido popularmente "Zé Botinha", apelido que ganhou ainda na juventude. "O transporte é bom, os motoristas são bons. O transporte é 'nois' mesmo que comprou, é o povo. Já tá pago", avisa. Um dos parceiros de viagem é o professor Célio de Oliveira, de 72 anos, que chega e já senta no banco ao lado do motorista. Entre um elogio e outro ao sistema de transporte, fala da vida e lembra que é bem conhecido na cidade pelos 30 anos lecionando matemática. "Meus primeiros alunos já são até avós", conta. A viagem cheia de prosa também tem a presença do aposentado Antônio Figueira, de 77 anos, que afirma embarcar no ônibus todos os dias. "Dou a volta pela Palmeira, Fundão. Encontra um, encontra outro. Tem que andar, senão fica entrando em depressão", brinca. VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região Veja mais notícias da região no g1 Campinas